Sentado ali, com um olhar perdido, uma barba crescida e um cabelo já branco. Ele ia. Ia sem dar bola pras pessoas que estavam ali em volta, se afastando, com medo, com nojo, com dó. Ia lutando pela vida, tentando um pouco de desatenção alheia. Entrou jogando no chão uma sacola cheia das latinhas que ele juntava pra trocar por dinheiro no final do mês. Dinheiro que ele usaria pra comer, pra viver, ou só sobreviver. Uma sobrevivência de angústia e solidão. E aquele olhar revelava tudo, todas as dores, as sofridões, a deselegâncias de uma vida perdida não se sabe em que momento. E ao mesmo tempo aquele olhar não trazia nada à tona. Não mostrava a escuridão de seus pensamentos e suas crenças tão insuperficiais.
E doeu olhar pr'aquela pessoa sem nome e sobrenome, e saber que ao mesmo tempo que eu e mais todo o resto daquele ônibus estaríamos entrando em casa, comendo uma janta repetitiva, tomando um banho quente e deitando num colchão delicioso e confortável, aquele homem, um zé ninguém, estaria procurando um cantinho de chão duro pra descansar o corpo cansado de sofrer.
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E agora, depois do texto sofrível de uma noite de sexta-feira, vou contribuir pra cultura útil do blog, apresentando a imagem acima. Imagino que muitos a conheçam de vista, mas não saibam seu real valor.
"O Grito (no original Skrik) é uma pintura do norueguês Edvard Munch, datada de 1839. A obra representa uma figura andrógina num momento de profunda angústia e desespero existencial. O pano de fundo é a doca de Oslofjord (em Oslo) ao pôr-do-Sol. O Grito é considerado como uma das obras mais importantes do movimento expressionista e adquiriu um estatuto de ícone cultural, a par da Mona Lisa de Leonardo da Vinci."